Prof
Heitor Hassani
Aula 01 e 02 – A AMAZÔNIA.
Neste início do século XXI uma
grande preocupação mundial une diferentes grupos de pesquisa, segmentos sociais
e governos - a conservação das florestas tropicais, o atendimento às
necessidades das populações humanas e o necessário crescimento econômico. Como
produto inicial dessa preocupação tem-se, hoje, a noção de que somente a partir
da adoção de um projeto de desenvolvimento sustentável que integre técnica e
melhoria social, será possível a conservação dos recursos naturais, das
florestas tropicais mundiais e melhoria da qualidade de vida para as populações
humanas.
Historicamente, é justamente nas
áreas intertropicais, localizadas entre as latitudes 23o Norte e 23o
Sul, que se encontram os países onde o binômio natureza e sociedade apresentam
elevados níveis de degradação. Suas histórias mostram uma triste relação entre
colonização, exploração dos recursos naturais, crescimento demográfico,
implosão demográfica de grupos autóctones, modo de produção, tecnologia e
exclusão social.
As conseqüências dessa relação, considerada
hoje, insustentável são: aumento em progressão geométrica dos processos ligados
a incorporação das terras ao modo de produção vigente, iniciado sempre pela
etapa do desmatamento; a deterioração das condições de vida no meio ambiente
rural e urbano; a perda das raízes culturais autóctones.
Nesse universo, o domínio
amazônico é reconhecidamente objeto de preocupações a nível mundial quanto a
sua progressiva deterioração natural e social e quanto a sua potencialidade e
importância para a manutenção do equilíbrio biosfera-atmosfera.
Estendendo-se por nove países:
Brasil, Colômbia, Peru, Venezuela, Equador, Bolívia, Guiana Francesa, Suriname
e Guiana, a Amazônia compreende uma área total de cerca de 7,8 milhões de km2.
Desse total 70% encontra-se em território brasileiro representando mais de 60%
(cerca de 5,5 milhões de km2) deste país.

Hidrograficamente,
a região amazônica integra as bacias hidrográficas do Amazonas, do
Tocantins-Araguaia e de parte da bacia do rio Orenoco(Venezuela). O rio
Amazonas com 6.577 km
de extensão é hoje considerado como o mais extenso e de maior volume d’água do
mundo. Predomina a floresta equatorial, mas encontra-se cerrado e manchas de
campos naturais, na ilha do Marajó e no estado de Roraima.
Estudos sobre a paisagem
natural realizados pelo IBGE (1995) com base em seus aspectos abióticos e
bióticos e a partir de mapeamentos realizados em escala de 1:2 500 000,
definiram um total de 104 sistemas de paisagens naturais e 224 subsistemas, na
área compreendida pela Amazônia brasileira.
Em contrapartida, esta mesma
Amazônia brasileira tem hoje um contingente populacional da ordem de 20 milhões
de habitantes, representando em torno de 15% do total da população brasileira,
dos quais cerca de 55% habitam aglomerações urbanas. As sociedades indígenas
remanescentes, perfazem um total aproximado de 160.000 habitantes.
Para fins político-administrativo
é definida no Brasil como Amazônia Legal, compreendendo os estados do Acre,
Amazonas, Roraima, Pará, Tocantins, Rondônia, Mato Grosso, Amapá e a maior
parte do oeste do Maranhão.


A sociedade regional é formada por
índios, caboclos, pequenos produtores, contingentes populacionais sem terra,
trabalhadores urbanos, grandes e pequenos proprietários, empresários
tradicionais e modernos. A maior parte desses atores sociais compõem os contingentes
de imigrantes que em diferentes épocas para aí se dirigiram, configurando outra
dimensão da diversidade tão característica dessa área. Trata-se não mais apenas
de sua diversidade fisico-natural e biológica, mas também, da diversidade de
povoamento, cultural, econômica e social.
Resumidamente,
pode-se considerar a transfiguração do mosaico ecológico e cultural da Amazônia
brasileira como produto de três grandes momentos: a expansão portuguesa no
século XVII; a procura da borracha no século XIX/XX; e as políticas
desenvolvimentistas da segunda metade do século XX.
Entretanto, a década de noventa
parece trazer em seu bojo um novo referencial quanto ao papel dessa região,
causada pelas transformações da ordem econômica e política mundial.
Configura-se uma nova fase referenciada agora pela revolução
científico-tecnológica, pela crise ambiental e pelos movimentos sociais.
Ao
longo desse tempo inúmeros projetos visando a organização e integração desse
espaço geográfico foram propostos e implantados. Entretanto, pode-se considerar
a década de sessenta como o grande marco a partir do qual as transformações
promovidas geraram as maiores transfigurações ecológicas e culturais. Ao
alvorecer da década de sessenta o contingente populacional era da ordem de 2,6
milhões atingindo cerca de 17 milhões ao final da década de oitenta.
Como resultante dessas
transformações tem-se do ponto de vista demográfico para o período entre 1960 e
1991 um crescimento do contingente populacional da ordem de 14 milhões de
habitantes, significando uma taxa de crescimento total de 550%. Enquanto do
ponto de vista da cobertura vegetal, levando-se em consideração as formações
vegetais florestais e não florestais, tem-se para 1991 um total de 14,07% do
território amazônico brasileiro impactado e/ou desmatado. É inequívoco que
essas transformações devem ter provocado modificações sensíveis na dinâmica e
capacidade de regeneração desses ecossistemas.
Presume-se, por outro lado, que
tais modificações deflagrem processos de alterações dos ciclos de água, no
balanço de energia na superfície, carbono e nutrientes que podem acarretar
conseqüências climáticas e ambientais em escala local, regional e global.
Entretanto, se por um lado essas
transformações podem ser consideradas como produto da própria história local de
ocupação humana, de outro, refletem a atuação de diferentes agentes externos
naturais e humanos, em escala planetária, que provocaram e provocam
modificações na dinâmica do ecossistema amazônico.
AMAZÔNIA BRASILEIRA


Com uma área de 5.109.812 km², a região é a maior do Brasil
e também a menos povoada. Rio e florestas dominam o seu território, onde as
chuvas dividem o clima: o primeiro semestre, quando chove muito, é o
"inverno"; o segundo semestre, com chuvas mais escassas, é o
"verão".
Instalados no litoral do Pacífico, no início do século XVI,
os espanhóis sonhavam com as riquezas das terras desconhecidas que ficavam além
dos Andes. Em 1539, Francisco Pizarro, conquistador do Peru, envia ao outro
lado dos Andes uma expedição comandada por seu irmão Gonzalo, acompanhado do
aventureiro Francisco de Orellana. Em
1541, os dois homens navegam já pelo rio Mapa; logo atingem o rio Marañón e
continuam na direção leste. A certa altura, Orellana, então no comando da
expedição, avista ao longe um grupo de indígenas. Acreditando tratar-se só de
mulheres, lembra-se das amazonas - guerreiras da mitologia grega - e dá nome ao
rio, chamado-o rio da Amazonas. Em 1542,
os espanhóis atingem o oceano Atlântico. Os portugueses, por sua vez, no século
seguinte, subiriam o rio Amazonas a partir do Atlântico em busca de riquezas e
da posse da terra para a Coroa. Mas a vasta região permaneceria praticamente
inexplorada até o surto da borracha, no século XIX.
Da viagem de Orellana até hoje
pouco mudou a paisagem da região Norte, caracterizados pela espessa floresta
cortada por uma intrincada rede de rios que converge para uma imensa planície.
Quando elementos da paisagem marcam fortemente a região Norte: a bacia do rio
Amazonas, a planície, a floresta e o clima. Eixo da maior bacia hidrográfica do
mundo, o rio Amazonas começa no Peru, na confluência dos rios Ucayali e
Marañón. Entra no Brasil com o nome de Solimões e passa a chamar-se Amazonas
quando recebe as águas do rio Negro, no interior do Estado do Amazonas. Das
cabeceiras do Marañón ao Atlântico o Amazonas mede 6.400 km , Recebe mais de
1000 afluentes e chega a ter 13
km de largura na planície e 100 km na foz. os baixos
Platôs da Amazônia ocupam cerca de metade da região. A planície de Várzea é limitada ao norte pelo planalto das Guianas -
onde está o pico da Neblina, a maior elevação brasileira, com 3014m - e ao sul
pelo planalto Brasileiro.
PERFIL
NORTE-SUL AMAZÔNICO

A vegetação que a recobre assume
diversos aspectos, dependendo dos locais onde se desenvolve. Ao lado dos rios
mais ricos em húmus (rios negros) cresce a mata
de igapó, inundada quase permanentemente e formada por árvores baixas,
trepadeiras e arbustos. Ainda ao longo dos rios, numa faixa de alguns
quilômetros de largura periodicamente inundada pelas cheias, estende-se a mata de várzea, domínio de árvores como
a seringueira, a imbaúba, a copaíba e o cacaueiro.
Nos níveis mais altos da
planície, e avançado pelos planaltos, desenvolve-se a mata de terra firme, livre das inundações periódicas, com árvores
como a castanheira e o caucho, que atingem até 60 m de altura. O conjunto
dessas matas - de igapó, de várzea e de terra firme - é a floresta amazônica,
ou hiléia brasileira. Trata-se da maior floresta do mundo, uma imponente massa
vegetal que se desenvolve sob o clima mais quente, úmido e chuvoso do Brasil. A
vastidão das matas fez com que a região Norte permanecesse isolada do resto do
Brasil, tendo como única via de acesso o sistema fluvial, navegável em toda a
planície. A foz do Amazonas constituiu assim a única porta de entrada para os
colonizadores vindos do mar; ali surgiu, à margem direita do rio Pará, sudeste
da ilha de Marajó, a cidade de Belém, que se tornaria a grande metrópole
regional. Outros núcleos de povoamento
estabeleceram-se à margem dos rios, onde havia condições para a criação de
portos, como em Santarém, Óbidos, Manaus e Porto Velho.
Na Segunda metade do século XIX a
região conheceu a maior prosperidade de sua história com a valorização
internacional da borracha, então encontrada quase exclusivamente nos seringais
da floresta amazônica. A Amazônia começou a atrair homens de outros países e de
outras regiões do Brasil, sobretudo do Nordeste, para o trabalho de extração de
látex. Manaus, bem no centro da zona produtora, desenvolveu-se de modo
vertiginoso. Mas o progresso teve curta duração: logo após a primeira Guerra
Mundial, a concorrência das plantações da Malásia - desenvolvidas a partir de
sementes contrabandeadas do Brasil - e, mais tarde, a descoberta da borracha
sintética, levaram a atividade extrativa à decadência, e a região retornou a
seu isolamento anterior. Hoje, além se ser a maior região do Brasil, o Norte
distingue-se das demais também por ser a menos povoada. Em seu imenso
território, que representa 42% da área total do país, vivem apenas, pouco mais
de 5% da população brasileira. Em sua maior parte - mais de 60% -, a população
da região Norte é constituída de caboclos, mestiços de branco e índios; cerca
de 30% são brancos e aproximadamente 4%, negros, havendo ainda uma certa
porcentagem de imigrantes de origem asiática. Os indígenas, que ocupavam a
região antes da vinda dos colonizadores europeus, hoje se encontram em
extinção.
OCUPAÇÃO NO PRIMEIRO PADRÃO
***As “Drogas do Sertão” (século XVII)
No vale do rio Amazonas, as
constantes incursões estrangeiras estimularam a intervenção da coroa
portuguesa, através da implantação de fortes
a princípio na embocadura do rio Amazonas (Belém/Macapá) e do incentivo à ação
de missões católicas, estas
penetraram nos confins da região, viabilizando a exploração dos produtos da
floresta (“drogas do sertão” - canela , cravo, salsa-parrilha, cacau nativo) e
ao mesmo tempo domesticavam a mão-de-obra nativa, facilitando a hegemonia lusa
na região. Essa expansão foi possibilitada graças à União Ibérica (1580/1640)
que veio a facilitar a ação no interior da região sem nenhum impedimento
fronteiriço e, realizada a separação, fez-se necessária uma nova divisão
política em que se reconheceu o uti possidetis
(fig. 5).
Ao longo do curso do Amazonas
e partindo das fortificações de Belém, os portugueses lançaram expedições
oficiais destinadas a estabelecer a presença colonial por todo o vale do grande
rio. Entre as inúmeras expedições, destacam-se a bandeira fluvial de Pedro
Teixeira (1637/1639), marco das explorações amazônicas oficiais e da epopéia do
bandeirante Antônio Raposo Tavares (1648/1651).


No plano da construção
espacial brasileira, as bandeiras ampliaram o limite do território conhecido, e
funcionavam, ao menos objetivamente, como vanguarda do poder colonial. A coroa
portuguesa, manobrando persistentemente e meticulosamente para a expansão
geográfica da sua soberania, ordenou a construção de fortificações ao longo do
perímetro exterior das expedições. Assim surgiram os fortes de São Joaquim(RR),
São José das Marabitanas (Alto Rio Negro), São Gabriel(Rio Negro), Tabatinga
(Rio Solimões) e Príncipe da Beira (Rio Guaporé), balizando o contorno das
nossas fronteiras terrestres.
***A economia da Borracha ( Séc.XIX e Início do Séc.XX )
Paralelo a expansão cafeeira,
ocorria na Amazônia o boom da borracha
(fim do século XIX e início do XX). A produção de látex foi transformada num
dos elementos mais importantes do espaço amazônico. O seringal se constituía em
grandes propriedades no interior da floresta, controladas pelos seringalistas.
O responsável pela extração do látex era o seringueiro.
A borracha atraiu para a
região amazônica muitos migrantes nordestinos (arigós) que se transformaram na
mão-de-obra. Estes trabalhavam através do Sistema de Aviamento no interior dos
seringais. Houve um deslocamento de nordestinos muito intensa para o extremo
oeste da Amazônia, garantindo com isso a posterior anexação de mais um Estado
ao território nacional, que foi o Acre. Segundo MONTEIRO 1997, alguns
migrantes, entretanto, se estabeleceram nas proximidades de Belém, onde deram
início a uma importante agricultura praticadas em pequenas propriedades
familiares. A maioria das cidades existentes no nordeste paraense (região
bragantina – área que vai de Belém a Bragança) teve sua origem nas colônias
agrícolas implantadas por nordestinos. Em outras áreas da Amazônia
também foram implantadas colônias agrícolas semelhantes como foi o caso de
Santarém e Monte Alegre, ambas no Pará.
*A borracha mudou
o espaço


A borracha teve uma importância econômica muito grande
para a nossa região nos fins do século XIX e início do século XX, pois, com a
invenção da vulcanização, ela passou
a ser uma importante matéria-prima
para as indústrias. O espaço geográfico amazônico, em consequência, passou por
grandes transformações, como veremos a seguir.
O seringal
foi transformado num dos elementos mais importantes do espaço da produção regional(...)
O
crescimento econômico e populacional atraiu também a indústria para a Amazônia.
Variadas fábricas, ligadas sobretudo ao setor de bens de consumo, se estabeleceram nas principais cidades,
destacadamente em Belém e Manaus.(...) as atividades produtivas mais
tradicionais: a roça, a coleta, a pesca e a caça não deixaram de existir. Se a
borracha e a indústria eram fonte de riqueza da elite, as atividades
tradicionais permaneceram, sobretudo, como fonte de sobrevivência de uma grande
parcela populacional.
O comércio
gerado pela exportação da borracha intensificou a circulação de pessoas e de
produtos. Para
facilitar o escoamento da produção e receber as mercadorias compradas no
estrangeiro, foram construídos os portos de Belém e Manaus. Nas cidades
menores, pequenos portos e os famosos trapiches passavam a ter a mesma
finalidade.
Neste período, até ferrovias foram
implantadas para agilizar o escoamento da produção regional: a Estrada de Ferro Madeira-Mamoré- escoava a
borracha de Guajará-Mirim até Porto Velho, cidades localizadas no Estado de
Rondônia; a Estrada de Ferro Bragantina -escoava a produção agrícola na rota
Bragança - Belém, no Estado do Pará; a Estrada de Ferro do Tocantins -escoava a
produção extrativa, principalmente a castanha, existente no sudeste do Pará,
até a cidade de Marabá (PA).
O
período de intensa exploração da borracha foi marcado por grandes
transformações nas cidades amazônicas. A rede
urbana passou por uma grande expansão. À medida que novas áreas iam sendo
ocupadas, como os vales dos rios Madeira, Purus e Juruá, surgiam novos núcleos
urbanos, que, na sua maioria, eram sedes de seringais. É o caso de Xapuri e
Brasiléia, ambas no Estado do Acre. Eram os seringais virando cidades.
Nas grandes
cidades da região, a elite, formada pelos barões da borracha, impõe um novo
modo de vida baseado em idéias trazidas da Europa. Vive-se a Belle Époque, termo francês que se
refere a um período marcado por construções urbanas de grande beleza
(palacetes, igrejas, praças e parques públicos, bosques, etc.), assim como de
espaços culturais (teatros, cinemas, escolas, bibliotecas e arquivos públicos,
jornais, etc.). As idéias européias se tornaram presentes no espaço amazônico,
para atender aos caprichos e gostos da elite. Por isso mesmo, apenas uma
pequena camada da sociedade amazônica pôde beneficiar-se das inovações. (...)
esse período de crescimento econômico e intensa reorganização do espaço entra
em crise devido à concorrência feita pela borracha produzida na Ásia.
A crise freou
o crescimento da maioria das cidades. Entretanto, algumas não sofreram tanto
com essa queda devido à existência de outras atividades econômicas, como o
plantio de juta nas várzeas do Médio-Amazonas e o extrativismo da castanha-do-pará, no sudeste paraense.
MONTEIRO. Alcidema et. al. O Espaço Amazônico: sociedade & meio ambiente. Belém :
UFPA/NPI,1997.