RIBAMAR - GEOGRAFIA

LICEU RIBAMAR BRAUN GEOGRAFIA

UNIDADE 01 – REGIONALIZAÇÃO DO ESPAÇO MUNDIAL: DO PERÍODO BIPOLAR AO PERÍODO MULTIPOLAR

01 – GEOPOLÍTICA DA GUERRA FRIA:

As alterações ocorridas no mapa da Europa nos últimos anos são o sinal de que vivemos um período de transição. É a estruturação da chamada nova ordem mundial, que vem substituir a velha ordem, marcada pela oposição entre Estados Unidos e União Soviética, em um período conhecido como guerra fria.
A guerra fria começou a desenhar-se logo após a Segunda Guerra Mundial. Mais precisamente durante a Conferência de Potsdam, realizada em Julho de 1945, quando as potências vencedoras decidiram dividir o território alemão em quatro zonas de ocupação, controladas, de leste a oeste, respectivamente, por União Soviética, Inglaterra, Estados Unidos e França. A capital alemã, Berlim, também foi ocupada e dividida entre os russos a leste, e franceses, ingleses e americanos a oeste. Veja os mapas abaixo.
Naquele momento, a bipolaridade que marcou o cenário geopolítico internacional no pós-guerra já estava configurada. Isso porque as duas grandes potências vencedoras — a capitalista, representada pelos Estados Unidos, e a socialista, representada peia União Soviética —tinham projetos antagônicos, não só para a Ale-manha como também para toda a Europa.
O antagonismo ficou claramente expresso a partir de 1947, quando o presidente norte-americano Harry Truman declarou a necessidade de conter os desejos expansionistas soviéticos no território europeu e, posteriormente, no território asiático.
Em virtude do seu importante papel na derrota do exército nazista pelo front oriental, desde fevereiro de 1945 os soviéticos transformaram todo o Leste europeu em uma grande área ocupada, alegando a necessidade de manter a segurança junto a suas fronteiras. Desde esse momento estabelecia-se a chamada "cortina de ferro", com a divisão da Europa em duas regiões geopolíticas: a Europa ocidental, sob a influência dos Estados Unidos, e a Europa oriental, sob a influência da União Soviética.
Para dar conta do projeto de contenção da influência soviética, os Estados Unidos financiaram a reconstrução e o fortalecimento econômico da Europa, através do Plano Marshal, e dos países do Leste e Sudeste asiáticos, através do Plano Comecon. Instalaram um arsenal nuclear nos países da Europa ocidental e envolveram-se em guerras localizadas, onde existia a oposição capitalismo versus socialismo, como as guerras da Coréia (1950-1953) e do Vietnã (1960-1973).
Por seu lado, em 1948, a União Soviética transformou as áreas de ocupação do Leste em governos pró-soviéticos, controlando-os de forma absolutamente autoritária, e também criou mecanismos de auxílio e cooperação econômica no interior do bloco socialista, através do Comecon.
Do ponto de vista do equilíbrio do poder, a guerra fria também se consolidou com a criação de duas grandes organizações militares: a Otan4 e o Pacto de Varsóvia, que tinham como principal objetivo impedir a expansão dos sistemas socialista e capitalista, respectivamente.
Essas organizações, bem como as guerras localizadas entre as duas superpotências, foram expressão clara de como o controle mundial efetivou-se através do chamado "equilíbrio do terror". A corrida tecnológica que colocou os dois países em posição militar de destruir o mundo todo, principalmente com as armas nucleares, serviu como um eficaz mecanismo de controle mundial.
O muro de Berlim, construído em 1961, para consolidar a divisão da capital, evitando a fuga de alemães orientais para o lado capitalista, foi o grande símbolo da bipolaridade, da disputa ideológica e militar entre os dois grandes vencedores da Segunda Guerra Mundial. Com a sua queda, em 1989, a velha ordem mundial começava a ruir.

Plano Marshall: plano de financiamento e de investimentos formulado pelos Estados Unidos para viabilizar a reconstrução da Europa no pós-Segunda Guerra. Tornou-se conhecido com esse nome numa referencie ao secretário de Estado norte-americano George Catlett Marshall, idealizado' os programa.
Plano Colombo: criado em 1951 para a "Cooperação Econômica e o Desenvolvimento Social na Ásia e no oceano Pacifico". O nome deriva de sua sede, Colombo, capital do Sri Lanka.
Comecon: sigla referente ao Conselho de Assistência Econômica Mútua dos paises socialistas, criado em 1949 e extinto em 1991. Foi a organização responsável pela coordenação e pela integração econômica dos países socialistas aliados à União Soviética.
OTAN: sigla referente á Organização do Tratado do Atlântico Norte, uma organização militar criada em 1949, sob a liderança dos Estados Unidos, para defender o Ocidente do inimigo socialista. Reúne os Estados Unidos aos seus principais aliados ocidentais e ao Japão. Ao contrario do Pano de Varsóvia, a Otan sobreviveu e até fortaleceu-se após o fim da Guerra Fria Hoje. vários são os países ex-socialistas que manifestaram seu desejo de ingressar na organização,
Pacto de Varsóvia: organização militar criada em 1955. Reunia os países socialistas à União Soviética, que liderava esta organização na defesa dos interesses socialistas durante a guerra fria Com a fragmentação da União Soviética, m dezembro de 1991, a organização lambem -o extinta.

As fronteiras que delimitam países são sempre algo provisório e passível de mudanças a qualquer momento, isso acontece porque as relações sociais que se estabelecem no interior desses, apresentam-se recheadas de contradições de todas as ordens: que vai da cultural à econômica, neste contexto há uma série de elementos estimuladores de sizões e constituições de novos Estados Nacionais. Então a turbulenta passagem da década de 80 para os anos 90, mostra a desestruturação de alguns países e o surgimento de novos. Isso gerado pela crise do modelo soviético e do socialismo real, bem como pela explosão do nacionalismo, fundamentalmente no Leste Europeu, exemplos: A Tchecoslováquia que foi desmembrada em república Tcheca e Eslováquia; e a Iugoslávia toda retalhada e dando origem a novos Estados; a grande URSS, uma das nações mais poderosas do século XX, desapareceu do mapa mundi, produzindo o surgimento de 15 novos países.
A configuração geográfica do continente africano, constituída em grande medida pelo imperialismo europeu na passagem do século XIX para o XX, deve, segundo estudiosos, ser redesenhada nas próximas décadas. Somando-se a essas questões há lutas em alguns pontos importantes e estratégicos do espaço mundial em que o separatismo e buscas por autonomias são combustíveis que estimulam e aquecem rivalidades entre grupos que convivem e conflitam no mesmo território, podemos citar, como exemplo, a região da Palestina, ocupada desde o início da era cristã por árabes chamados de palestinos, que passou na Segunda metade do século XX ao controle do povo judeu. Esse processo foi marcado por uma série de conflitos que mobilizou boa parte dos países e da opinião pública mundial. É importante também ressaltar a luta dos bascos na fronteira da França com a Espanha para a constituição do país Basco; e também a busca pela unificação das Irlandas em que os católicos do norte da ilha são atores principais.
Assim, pensar o espaço mundial como algo sempre em movimento é uma tarefa que exige compreensão da realidade cotidiana. Então as realidades específicas estão entrelaçadas e recheadas de divergências que desafiam e colocam em cheque configurações e modelos espaciais criados pelo homem, ao longo de sua trajetória. Essas criações, sempre passíveis de serem recriadas, afinal são frutos de relações sociais contraditórias, que se estabelecem no grande teatro da humanidade, o Planeta Terra.
O geógrafo J. W. Vesentini afirma "que uma das grandes preocupações da Geografia é a regionalização da superfície terrestre, do espaço que serve de morada para a humanidade, como ciência do espaço, a geografia vem procurando criar mecanismos no sentido de propiciar entendimento das formulações e diferenciações espaciais criadas pêlos homens".
Existem inúmeras formas de dividir o espaço mundial, dependendo do referencial que se utiliza isso com o objetivo de facilitar nosso entendimento sobre o assunto. Então iremos abordar algumas das formas mais conhecidas de regionalização do mundo:

a) Divisão em continentes:
Há como referência fundamental elementos naturais, principalmente, a questão geológica, este tipo de regionalização concebe o espaço mundial dividido em cinco grandes massas continentais: Europa, América, Ásia, África e Oceania.

b) Os “três mundos”:
Durante o período da guerra fria (1945/1991) este tipo de divisão foi bastante utilizada, baseava-se em critérios sócio-econômico e ideológico, definia três campos bem diferentes:
·          Primeiro mundo     - formado pelo conjunto de países capitalistas desenvolvidos.
·          Segundo mundo    - formado pêlos países de economia planificada (socialismo real).
·          Terceiro mundo     - formado pêlos países subdesenvolvidos.
Obs.: Esse tipo de divisão do espaço não é mais tão utilizado hoje, em função da crise do socialismo real e conseqüente desaparecimento do bloco socialista.

c) Divisão Leste x Oeste
Pautada em critérios políticos e econômicos foi bastante utilizada durante o período da guerra fria para identificar os países do bloco soviético (Leste) e os países do bloco capitalista (Oeste).

d) Divisão Norte x Sul:
Uma das formas mais utilizadas, nesta virada de século, para dividir o espaço mundial, tendo como referência fundamenta à questão do desenvolvimento econômico e industrial:
·          Países do Norte - desenvolvidos a altamente industrializados e que assumem papel de vanguarda do ponto de vista comercial e tecnológico.
·          Países do Sul - países com condições de desenvolvimento econômico, social e tecnológico inferiores aos primeiros e que historicamente ocupam papel periférico dentro da divisão do trabalho, no espaço mundial.

É importante ressaltar que os países do sul subdesenvolvidos não constituem um bloco homogêneo, havendo entre esses países grandes diferenças estruturais, sociais e até no campo econômico, aliás, coisas que discutiremos com maior fôlego na próxima unidade.
A oposição entre o Norte industrializado e o Sul subdesenvolvido é reforçada pela crise do mundo socialista, que novamente se volta para o sistema capitalista. Como se observa no mapa, a linha divisória entre o Norte e o Sul não é um paralelo (o Equador ou o trópico de Câncer) e sim uma linha com várias curvas, que dá voltas para encaixar melhor um ou outro país. Na parte leste ou oriental, por exemplo, essa linha dá a volta, vindo bem para o sul, para encaixar a Austrália e a Nova Zelândia no Norte industrializado. Já no leste asiático, a China e a Mongólia, situadas bem mais ao norte que esses dois países da Oceania, ficam encaixadas no Sul subdesenvolvido. Portanto, não se trata dos hemisférios norte e sul (divididos pelo Equador), como muitas vezes se imagina, e sim de um Norte e um Sul metafóricos ou econômico-sociais.
e) Os pólos de poder econômico:
Outra forma de dividir o espaço mundial, pois faz parte de uma tendência da nova ordem mundial que se concretiza, no mundo, na virada da década de 80 para os anos 90.
Áreas indefinidas no mapa:
·          CEI - Comunidade de Estados Independentes (ex-URSS) - Por um lado, pode vir a tornar-se uma periferia da Europa; por outro, pode ocorrer a incorporação das repúblicas meridionais e islâmicas ao Oriente Médio. Pode também vir a ser um mercado comum efetivo, menos importante que os três principais.
·          Oriente Médio - Área de disputa entre os três pólos ou centros importantes, com vantagem momentânea para os Estados Unidos; pode também vir a ser uma região original pela união dos povos e Estados islâmicos, com tendência a não se alinhar preferencialmente em nenhum dos três centros.
Nota.: Observe que a linha divisória Norte/Sul está representada por um traço bem forte, e a área de influência de cada um dos três principais centros mundiais de poder está limitada com traços fracos. Com isso quisemos mostrar que a oposição entre os países ricos ou industrializados e os países subdesenvolvidos é, algo mais visível e in¬discutível. A área de influência de cada pólo internacional é por enquanto fluida, relativamente indefinida, pois em muitos casos essas áreas se inter-penetram. Por exemplo, na área hipotética de influência dos Estados Unidos (como o Brasil ou a Argentina) há um aumento dos investimentos europeus. E na área teoricamente japonesa (como a Coréia do Sul ou Hong Kong), os investimentos de capitais norte-americanos superam os do Japão. Essas áreas de influência, portanto, devem ser vistas mais como tendências ou possibilidades e não como realidades fechadas.

02 – A NOVA (DE$) ORDEM MUNDIAL:
Desde a queda do Muro de Berlim, em novembro de 1989, um dos assuntos mais discutidos, na imprensa e nos círculos acadêmicos, é a emergência de uma Nova Ordem Mundial.
A Nova Ordem Internacional apresenta basicamente duas facetas, uma geopolítica e outra econômica. Na geopolítica, a grande mudança foi o fim da Guerra Fria e, conseqüentemente, da bipolarização de poder entre as duas superpotências, Estados Unidos e União Soviética, e dos Blocos Militares rivais por elas comandados. Com isso, abriu-se espaço para um mundo multipolar econômico do que bélico. Na economia, o grande fato novo é o aprofundamento do processo de globalização e a formação de blocos econômicos supranacionais.
Guerra Fria - Nova Ordem Mundial

As principais características da Nova (Des)Ordem Mundial, são:
a) Multipolaridade: deixa de existir uma ordem bi-polar e passam a existir novos pólos de poder no cenário mundial. Os três principais são os Estados Unidos, a Europa Ocidental e o Japão, que periferizam áreas no espaço mundial.
b) Poder: a lógica dessa ordem caracteriza um país como superpotência a partir da análise da disponibilidade de capitais, avanço tecnológico, qualificação da mão-de-obra, nível de produtividade e índices de competitividade.
c) Internacionalização do Capital: com o fim do bloco socialista houve a ampliação do comércio e da circulação de capital no espaço mundial, que passou a interligar os vários mercados existentes.
d) Interdependência: com a ampliação das trocas comerciais, os mercados ficam dependentes cada vez mais uns dos outros. Assim, qualquer abalo em uma economia, os efeitos surgirão em economias no mundo todo.
e) Ricos x Pobres: a diferença econômica e social entre os países ricos e os pobres intensificaram-se, já que no comércio mundial há uma dominação por parte dos países ricos, o padrão de vida é muito mais baixo nos países pobres, etc.
f) Globalização: embora este processo tivera seu início com as grandes navegações, ele intensificou-se na Nova Ordem Mundial, já que nela existem fatores que contribuem para o seu avanço, como o amplo avanço tecnológico, a integração espacial, o avanço nos meios de transporte e comunicação... sendo que a formação de um mercado global está mis próxima, embora existam processos que vem por travar seu avanço.
g) Regionalização: a formação de blocos aparece na Nova Ordem como uma alternativa de proteger as economias dos países mais da concorrência global e de fortalecer as economias inseridas em um bloco econômico ou de intensificar o comércio regional. Por isso caracteriza-se como um processo antagônico e complementar à Globalização.
h) Neoliberalismo: como a globalização transcende os aspectos econômicos e culturais, a política também passa por transformações, como a mudança do papel do estado, que se ausenta dos setores econômicos e sociais, ou seja, tendo seu papel enfraquecido, com um caráter Neoliberal no espaço mundial.

03 – A CRISE DO SOCIALISMO SOVIÉTICO

No período existente da bipolaridade, um dos mecanismos de dominação por parte das duas potências foram as organizações militares (OTAN e Pacto de Varsóvia), porém para a manutenção de tais foram aplicados grandes quantidades de capitais no setor bélico.  Nessas circunstâncias, para agravar a crise soviética, outros fatores contribuíram; tais como:
- as atividades industriais estavam obsoletas, o que não gerava recursos suficientes para a população. Isso porque os investimentos soviéticos eram aplicados inicialmente no seu arsenal nuclear;
- a atividades agrícolas também não conseguiam produzir alimentos suficientes;
- a corrupção pelos dirigentes do Partido Comunista que usufruíam de melhores condições de vida em oposição a maioria da população;
- o autoritarismo do partido que excluía qualquer liberdade de expressão contrária e etc.

3.1 – As Reformas:
A somatória desses fatores levaram o país a uma verdadeira crise sócio-econômica que nos anos 80 o seu novo líder Mikhail Gorbatchov lançou um amplo programa de reformas na eminência de reestruturar o país economicamente, dando a população liberdade de consumo numa tentativa de aliviar o quadro crítico social. Tais reformas foram:
A – Perestroika: que significa reconstrução, fazendo referência a necessidade de reconstruir a economia
soviética sobre novas bases a partir de uma relativa abertura para o capitalismo.
B - Glasnost: que significa transparência, onde o objetivo era expressar uma nova relação entre o poder e a sociedade. Com isso o pluripartidarismo estava lançado no seio da população.
Com as reformas postas em práticas por Gorbatchov, as mudanças, tanto no interior da URSS como nos países do Leste Europeu, começaram a acontecer de uma forma vertiginosa. Em certos casos ocorreram ‘reformas’ (Hungria, Polônia e Tchecoslováquia, além da reunificação alemã após a queda do muro em 1989) e ‘revoluções’ (Romênia que acabou com a morte de seu ditador Nicolae Ceausescu). Assim no início de 1991, foram realizadas as primeiras eleições democráticas no Leste europeu.
Com relação a união Soviética, as tensões haviam ampliado após tais reformas provocando divergência no interior do partido e nesse momento, data o ano de 1989 quando as “três irmãs” (Lituânia, Letônia e Estônia) declararam-se independentes aproveitando-se, inclusive da fragilidade das forças do Pacto de Varsóvia.
Posteriormente, em dezembro de 1991, o grande império vermelho se desmembrava, ou seja, sofria uma fragmentação político-territorial dando origem a Comunidade dos Estados Independentes (CEI).

3.2 – A DESINTEGRAÇÃO DO MUNDO SOVIÉTICO E O PAPEL DA CEI NA ORGANIZAÇÃO ECONÔMICA E POLÍTICA REGIONAL

3.2.1 AS CONTRADIÇÕES DO SOCIALISMO REAL E A CRISE DO MUNDO SOVIÉTICO

3.2.2 – O TOTALITARISMO E A AVERSÃO DO POVO AOS REGIMES SOCIALISTAS:
Em todos os países que seguiram o modelo soviético, houve a ascensão de uma elite dirigente denominada de burocracia. Essa elite era formada por membros da cúpula do partido comunista que exerciam os cargos mais importantes no governo. A burocracia usufruía o melhor de tudo e para ser manter no poder, geralmente implantava um regime totalitário, caracterizado: pelo monopolismo partidário (a existência de um só partido); dogmatismo político e ausência de liberdades individuais. A ausência de democracia criou uma aversão da sociedade aos governos comunistas, já que a população, satisfeita em suas necessidades materiais básicas (educação, saúde, habitação), vislumbrava maior liberdade política e econômica, pois o socialismo “socializou os bens, mas privatizou os sonhos, enquanto o capitalismo privatizou os bens, mas socializou os sonhos”
(LEONARDO, Boff, Cadernos do terceiro mundo, 153).

O texto a seguir exemplifica a distância entre a sociedade e a burocracia governamental na Polônia.
“Segundo a doutrina oficial, vivemos num país socialista. Esta tese tem por base a identificação da propriedade estatal dos meios de produção com propriedade social O ato de nacionalização teria transferido a indústria, os transportes e os bancos para a sociedade (...). Esse raciocínio parece ser marxista. Na realidade introduziu se na teoria marxista um elemento que lhe é estranho, ou seja, a concepção formalista e jurídica da propriedade (...). A propriedade estatal dos meios de produção não é senão uma forma de propriedade. Pertencente aos grupos sociais a que pertence o Estado. (...) A quem pertence o poder do nosso Estado? A um só partido, praticamente monopolista. (...) Todas as decisões são tomadas inicialmente pelo partido e mais tarde, pelos organismos oficiais (...). Nenhuma decisão de importância pode ser tomada e realizada sem ter sido sancionada pelas autoridades do partido. O partido que governa tem p monopólio do poder. A classe operária não tem possibilidade de se organizar formando outros partidos (...). Como qualquer aparelho ele é organizado de maneira hierárquica. As informações circulam de baixo para cima e as decisões, as instruções, de cima para baixo. Como em todo aparelho hierarquizado, na origem das ordens encontram-se urna elite, um grupo de pessoas (...) que elabora as decisões fundamentais. No nosso sistema, a elite do Partido é ao mesmo tempo a elite governamental. (...) As decisões da elite são livres e independentes de qualquer controle por parte da classe operária e do resto da sociedade. (...) No nosso sistema não há capitais privados. As fábricas, as minas, as siderurgias, e tudo o que produzem, são propriedades do Estado. Mas, visto que o Estado se encontra nas mãos da burocracia política central, que dispõe dos meios de produção e explora a classe operária, a totalidade desses meios de produção transformou-se num “capital” nacional, centralizado e único. (...) A quem vende o operário a sua força de trabalho? Aqueles que dispõem dos meios de produção portanto a burocracia política central. A este título, a burocracia política central é uma classe dominante: tem o poder exclusivo sobre os meios de produção, compra a força de trabalho (...) que explora (.,) com o fim de reforçar e alargar o seu poder sobre a produção e a sociedade.”
(KURON, Jarek & MODZELEWSKI, Natal. Carta ao Partido Operário Polaco (acertos): Porto, editora Paisagem, 1975, p.23, 42-3) GEOGRAFIA HOJE - A FORMAÇÃO GEOGRÁFICA DO MUNDO CONTEMPORÂNEO Carlos Walier & e Jorge Luiz, editora ao livro técnico)

3.3 – CENTRALIZAÇÃO ECONÔMICA E O MILITARISMO
Os regimes socialistas, sobretudo a URSS mantiveram um crescimento econômico acelerado e concentrado nas indústrias de base até a década de 70, porém a partir desse contexto, a excessiva centralização do poder político e administrativo nas mãos da burocracia retardou a tomada de decisões e acabou impedindo o desenvolvimento das novas tecnologias que emergiam como a informática, robótica, telecomunicações e biotecnologia. Essa situação trouxe o atraso tecnológico dos setores de bens de consumo (alimentação, vestuário, remédios, eletrodomésticos e automóveis) repercutindo assim na queda da qualidade e na oferta de produtos. Esse fato explicava a existência das filas no cotidiano da ex-URSS, em função da escassez produtiva frente ao crescimento das necessidades de consumo da população, cada vez mais fascinada pelo modelo de vida dos países capitalistas desenvolvidos. Ao lado disso os interesses da burocracia em potencializar o seu poder mediante mais investimentos no setor militar, agravou a divisão do país, pois enquanto o mundo todo considerava a URSS uma potência bélica, a economia civil padecia de um crescente atraso tecnológico. Essa contradição é descrita de forma bem precisa no texto abaixo:

3.4 - A BUSCA DE SOLUÇÕES PARA AS CONTRADIÇÕES DO SOCIALISMO REAL
As contradições político-econômicas da URSS desencadearam mudanças substanciais, representadas pela Perestroika (reestruturação econômica) e Glasnost (abertura política), estas duas diretrizes surgiram com a ascensão de Mikail Gorbatchev ao poder em 1985. Gorbatchev diagnosticou a situação do iminente colapso do país e de sua periferia imediata e por isso buscou no ocidente apoio político e econômico para viabilizar tais reformas:

3.4.1 – AS REFORMAS PROPOSTAS

A) ABERTURA ECONÔMICA (PERESTROIKA)
• Abertura da economia ao capital estrangeiro e aproximação com os países ocidentais, sobretudo com os EUA.
• Inversão de prioridades econômica coma redução dos gastos militares e maior ênfase às indústrias de bens – de – consumo e à agropecuária para atender aos anseios da população.
• privatização de empresas estatais problemáticas.
• Redução da ajuda econômica aos países aliados do bloco socialista, sobretudo do leste europeu.
Objetivos: modernizar a economia da URSS visando superar o atraso tecnológico e adaptar o país à globalização para impedir a queda do socialismo.

B) A ABERTURA POLÍTICA (GLASNOST)
• Maior liberdade de expressão, com tolerância às criticas  contra o funcionamento de alguns órgãos de comunicação do governo.
• Liberdade religiosa para o funcionamento de seitas e religiões.
• Anistia política para os expurgados durante o período stalinista.
• Autonomia para as minorias étnicas que lutassem pelos seus direitos.
• Pluripartidarismo, quebrando o monopólio do partido comunista.
Objetivos: conceder democracia para conseguir o apoio do povo às reformas do governo e assim impedir a derrubada do socialismo.

4. PRINCIPAIS TRANSFORMAÇÕES DO MUNDO SOVIÉTICO COM O ESGOTAMENTO DO SOCIALISMO REAL

4.1 – A PROLIFERAÇÃO DE CONFLITOS ÉTNICOS E O FIM DA URSS
A liberdade de expressão com a glasnost trouxe a tona rivalidades históricas entre as etnias de várias repúblicas (ucranianos, lituanos, armênios e outros) e as minorias russas que foram impostas nessas repúblicas durante o período ditatorial para a criação de uma identidade nacional que nunca foi concretizada. As etnias que habitavam as repúblicas soviéticas aproveitaram o fracasso da Perestroika e a autonomia da glasnost para declararem a independência das 15 repúblicas sob a liderança da Rússia, através da liderança de Boris Yeltsin. A fragmentação da URSS dava origem a 15 novos países, apesar da separação política essas nações mantiveram laços econômicos criando a CEI - Comunidade dos Estados Independentes que consiste numa Confederação de repúblicas, com fortes vínculos entre si, mas que preserva a soberania de cada uma das nações, não possui um governo central, mas sim um conselho de Chefes de Estados (embora a Rússia exerça certa liderança política, econômica e cultural). Tem urna moeda comum, o rublo, que circula em todas as repúblicas. Esta união foi oficializada pelo acordo de Minsk. Atualmente é mais que uma simples comunidade econômica, havendo livre circulação de bens, serviços, pessoas e mercadorias. “A abertura à expressão política para sociedade em massa deu vazão à pressão contida das identidades nacionais - distorcidas, reprimidas e manipuladas durante o stalinismo. A busca por fontes de identidade distintas da decadente ideologia comunista provocou o esfacelamento da ainda frágil identidade soviética, enfraquecendo o Estado soviético de forma decisiva. O nacionalismo, inclusive o russo, tomou-se a expressão máxima dos conflitos entre sociedade e Estado, sendo o fator político imediato que culminou no processo de desintegração da União Soviética.”
(Castels, 1999).



4.2 - A TRANSIÇÃO DO MUNDO SOVIÉTICO PARA O CAPITALISMO E A INSTABILIDADE ECONÔMICA DA CEI
A derrubada dos regimes comunistas representou a abertura do Leste Europeu para a economia de mercado. Os países da região, a começar pela Rússia, adotaram políticas neoliberais de forma acelerada, com a privatização de empresas estatais, liberação de preços e corte dos investimentos sociais. Em conseqüências de medidas houve aumento de preços com a elevação da inflação e conseqüentemente instabilidade financeira. O governo de alguns países como a Rússia foram obrigados a desvalorizar suas moedas, o que agravou o quadro de desequilíbrio culminando com a quebra da bolsa de valores do país. A instabilidade econômica tem reduzido as perspectivas de inserção da CEI na economia global em função dos seguintes fatores:


4.3 - A EXPANSÃO DO CRIME ORGANIZADO NOS PAÍSES DA CEI
Na nova Rússia, o crime organizado migrou do antigo mercado negro dos tempos do comunismo para setores da economia que não foram devidamente regulamentados. Sob a bênção de políticos e burocratas corruptos ¾ mais de 2.500 funcionários estão sob investigação judicial ¾, cerca de 200 organizações criminosas controlam desde o comércio de pedras preciosas até a pescaria comercial. Nas maiores cidades, a máfia russa controla todos os tentáculos do mercado de entretenimento, incluindo as grandes agências de modelos. Numa outra versão da prostituição na Rússia, as manequins só conseguem bons contratos se dormirem com o mafioso certo.”... A transição caótica da União Soviética para a economia de mercado propiciou condições ideais para a penetração generalizada do crime organizado nas atividades empresariais da Rússia e das demais repúblicas. Também induziu a proliferação de atividades criminais originárias da Rússia e da ex-União Soviética, tais como o tráfico ilegal de armas, materiais nucleares, metais raros, petróleo, recursos naturais e moeda. As organizações criminosas internacionais associaram-se a centenas de redes das máfias pós-soviéticas, muitas delas organizadas em torno de determinadas etnias (chechenos, azeris, georgianos, etc.), para lavar dinheiro, adquirir propriedades de valor e assumir o controle de negócios lucrativos, tanto legais quanto ilegais. Um relatório de 1994 sobre o crime organizado, realizado pelo Centro de Análise de Política Social e Econômica do Gabinete da Presidência da Rússia estimou que, praticamente, todos os negócios privados de pequeno porte estavam pagando tributo a grupos criminosos. Quanto às empresas privadas e bancos comerciais de maior porte, constatou-se que de 70% a 80% deles também estavam pagando proteção a grupos criminosos. Esses pagamentos representavam de 10% a 20% do faturamento dessas firmas, montante equivalente a mais da metade de seus lucros. Os novos ricos da Rússia passaram a comandar seus negócios em Moscou on-line de suas mansões na Califórnia, para escapar das ameaças dirigidas a eles próprios e a suas famílias, ao mesmo tempo mantendo seu envolvimento diário nas transações que lhes davam a oportunidade de fazer uma fortuna praticamente sem paralelo no mundo. Com freqüência, o cumprimento de contratos comerciais, em um meio legal incerto, era assegurado através de intimidações e, às vezes, por meio de assassinatos. Nem sempre o crime organizado ficava satisfeito em subcontratar agentes que usavam de violência ou operações ilegais a troco de determinada quantia paga a título de ‘contribuição’. Queria e, em geral, conseguia participação no negócio, seja sob a forma de ações, seja, mais freqüentemente, em dinheiro ou, então, favores especiais, tais como empréstimos a taxas de juros preferenciais ou oportunidades de praticar contrabando. No setor privado, as empresas vinham pagando ‘impostos’ às organizações criminosas em vez de contribuir para o governo. Na realidade, a ameaça de denunciar a sonegação fiscal praticada pelas empresas aos fiscais do governo era um dos métodos de extorsão utilizados pelo crime organizado”.
(Fonte: A conexão perversa: a economia do crime global: Fim de Milênio, Manuel Castells. São Paulo: Paz e Terra. 1999)


LEITURA COMPLEMENTAR

QUEDA DO MURO DE BERLIM
Na noite de 9 novembro de 1989, um comunicado confuso das autoridades comunistas da Alemanha Oriental liberava a passagem nos postos de controle da fronteira berlinense. O Muro de Berlim, símbolo principal da Guerra Fria, era desativado, como conseqüência das manifestações populares que desmoralizavam o governo da República Democrática Alemã (RDA).
Uma multidão incrédula e exultante de cidadãos da parte Ocidental da cidade atravessa livremente, pela primeira vez, a barreira que dividia a velha capital Alemã. Em meio aos fogos e à festa nas de Berlim, terminava o período histórico da Guerra Fria.
Esse acontecimento, cronologicamente tão próximo de nós, já parece distante. Depois dele, a União Soviética entrou em decomposição, originando quinze estados independentes e inúmeros focos de tensão conflito militar. Ao mesmo tempo, a Iugoslávia deixara de existir, sob o impacto dos choques dos nacionalismos balcânicos.
Mais recentemente, a Tcheco-Eslováquia anunciava a separação, fragmentando-se nas suas duas componentes históricas: as repúblicas checa e eslovaca. Desenha-se, enfim, um novo mapa no espaço que antes era ocupado pela União Soviética e suas áreas de influência.
A Europa foi o cenário principal da Guerra Fria. A bipartição do continente em blocos geopolíticos e alianças militares antagônicas – O pacto de Varsóvia e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) – refletia a bipolaridade de poder mundial.
A velha ordem mundial, a ordem da Guerra Fria, estruturava-se em trono do conflito entre os Estados Unidos e a União Soviética. Nascida da Segunda Guerra, essa ordem apoiava-se sobre a divisão da Alemanha, síntese da divisão Européia. A reunificação alemã de 1990 assinalou a reorganização de toda a geometria do poder no espaço europeu.
O novo mapa do mundo está voltado para a discussão das transformações recentes na organização do espaço mundial. Essa expressão designa uma realidade mais complexa que a Guerra Fria, pois emergem novas potências, como Japão e Alemanha unificada, característica da multipolaridade de poder planetário. Ela reflete também a dissolução do conflito ideológico entre o capitalismo e o socialismo e a reaparição das guerras nacionalistas na Europa e na Ásia.
A “nova ordem” internacional não está estruturada em torno de dois pólos de poder, mas sobre megablocos econômicos e geopolíticos. O processo tumultuado da unificação européia, a criação do mercado comum da América do Norte (Nafta) e a consolidação da zona econômica do Pacífico são dimensões de um novo estágio da economia mundial, que dissolve as fronteiras nacionais.
O poder do dinheiro - e a “guerra comercial ”que se anuncia entre os megablocos econômicos -  substitui o poder das armas e o velho espectro da guerra nuclear. As disparidades entre a riqueza e pobreza acentuam o abismo Norte – Sul, um novo antagonismo que substitui o velho conflito Leste-Oeste. Contudo a pobreza se dissemina também no Norte: não só na Europa Oriental e antiga União Soviética como nas prósperas potências européias e nos Estados Unidos.

Bibliografia: Coleção Polêmica, O novo mapa do Mundo, Demétrio Magnoli, Editora Moderna